Paquistaneses vão hoje à urnas
Eleições legislativas no Paquistão são referendo a Musharraf e a Bhutto
18.02.2008 - 09h06 Graham Usher, Lahore
Numa localidade remota do Punjab, mil pessoas estão reunidas num vale poeirento. Os homens estão sentados em cadeiras, os rapazes nos muros e as mulheres nos telhados, com lenços a agitar ao sol. Escutam Nawabzada Ghazanfar Ali Gul, o candidato local do Partido do Povo do Paquistão (PPP) de Benazir Bhutto.
Homem esquelético com um chapéu de pele, casaco de lã e uma oratória ambiciosa, Ghazander disputa este distrito há 20 anos. As eleições de hoje são as mais esperançosas que o seu país viu, diz. "Digo-vos o que disse ao Exército - ou Musharraf ou o Paquistão!". As massas rugem em aprovação. Foguetes riscam o céu.
No sossego da sua casa, Ghazanfar é mais sóbrio. Se "é Musharraf ou o Paquistão", como pode o PPP trabalhar com o Presidente num Governo, perguntamos-lhe. "Vamos ver. Mas teremos de encontrar um modus operandi se for para haver reconciliação", responde.
É um dos imponderáveis nas eleições de hoje. Outro é quantos dos 80 milhões de paquistaneses se darão ao trabalho de ir votar. A fraude é endémica. A adesão raramente passa os 40 por cento. Desta vez pode ser ainda mais baixa, devido a uma campanha de ataques por parte dos islamistas. No sábado, um carro armadilhado atingiu um comício do PPP, perto da fronteira afegã, matando 40 pessoas.
Mas a principal incerteza deve-se ao facto de estas eleições serem um referendo a dois indivíduos que não as disputam na realidade. Um é o Presidente Musharraf. Em Novembro, garantiu um novo mandato de cinco anos impondo a lei marcial. Depois, purgou o Supremo Tribunal dos juízes que estavam prestes a decidir contra a sua presidência. O outro é Bhutto, cujo assassínio a 27 de Dezembro poderá catapultar o PPP para o poder à boleia de um voto de simpatia.
Todos os cenários
Bhutto regressou de oito anos de exílio como parte de um acordo de partilha de poder com Musharraf. Mas os seus apoiantes - e os paquistaneses em geral - acusam-no do assassínio. Longe de reconciliar, as eleições parecem ser uma receita para o confronto. "Sim", acena Kamran Shafi, ex-secretário de imprensa de Bhutto. "O coração estremece."
O confronto parece ser o fim de todos os cenários traçados pelos analistas. O menos provável é que Musharraf continuará com as rédeas se a coligação de partidos que juntou em 2002 for outra vez capaz de formar Governo. É consensual que isto só poderá acontecer com fraude. E, ao contrário de 2002, desta vez as pessoas irão protestar, diz Shafi. "Viu a violência desencadeada pela morte de Bhutto? Imagine a raiva se as eleições parecem ter-lhe sido roubadas."
O segundo cenário é o que prevêem as sondagens. Mostra o PPP a liderar uma coligação anti-Musharraf, com a Liga Muçulmana do ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif. Sharif diz que vai exigir a recondução dos juízes e o fim "das acções inconstitucionais" cometidas no estado de sítio. Por outras palavras, a demissão de Musharraf.
Na melhor das hipóteses, isto augura uma crise política entre o Presidente e o parlamento. Na pior, o Exército poderá novamente entrar em acção para separar os políticos belicistas.
Exército desistiu de Musharraf
Mas o Exército já não está virado para esse papel, comenta o analista Rasul Baksh Rais. "Quer retirar-se da política. Sabe que não pode ser uma organização profissional sem apoio popular. Mas este desapareceu por causa da exploração que Musharraf fez do Exército para fins políticos."
O terceiro cenário tenta casar os dois anteriores, em que um Governo de consenso nacional é formado a favor da reconciliação (e não do conflito) entre o Parlamento e a presidência. Esta é a "coligação dos moderados" que Washington apoia. Era a base do acordo Bhutto-Musharraf.
Mas isso desfez-se com as explosões da lei marcial e a carnificina do assassínio de Bhutto. Não pode ser ressuscitado, diz Rais. "Há a sensação de que Musharraf pode chegar a extremos para ficar no poder."
Muitos corações estremecerão quando os paquistaneses forem - ou não - às urnas. Eles sabem que a era militar que começou com o golpe de 1999 está a chegar ao fim. E que o Presidente continua a ter o poder. O medo é que o interregno entre ele e a nova era seja sangrento.
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008
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1 comentário:
Isto foi ontem pá!!
Não queremos cá notícias requentadas, pá! Enfia-as no onhofe! poker-alho!
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